projeto premiado sobre Minhocão - O Novo Elevado

O Novo Elevado

José Alves e Juliana Corradini
Frentes Arquitetura

1º Prêmio - PRÊMIO PRESTES MAIA DE URBANISMO – UMA CICATRIZ CORTA A CIDADE: SOLUÇÕES PARA O ELEVADO COSTA E SILVA (MINHOCÃO), São Paulo, SP - 2006
1º Prêmio - 7ª BIENAL INTERNACIONAL DE ARQUITETURA DE SÃO PAULO - 2007
Exposto na 10ª Bienal de Veneza, 2006

O Minhocão será transformado em uma inédita estrutura urbana e instituirá uma outra conexão entre a cidade e o seu entorno, entre os edifícios e sua implantação, interagindo com as condições existentes, complementando as redes de tráfego, o espaço cheio e o vazio. Ressurgirá sob novas formas de engenharia, de arquitetura e de espaços urbanos cuja expressão e representação será única e notável no contexto da cidade de São Paulo.

Manteremos o Elevado de pé, com sua função atual de conexão viária leste-oeste, porém propondo uma nova topografia que surgirá como uma experiência para diversificar a velocidade do fluxo atual desta construção tão bruta e odiada, transformando-o em um contemporâneo arcabouço pelo acoplamento de uma nova estrutura metálica ao corpo do Minhocão, constituindo-se em um único sistema com múltiplos usos e funções: um Parque elevado sobre as pistas de tráfego ao longo de toda a sua extensão, galerias laterais com usos diversificados, localizadas em pontos estratégicos e, anexados e coordenados a este novo conjunto, edifícios de acesso e de apoio infra-estrutural ao Parque e às galerias, com programas variados, públicos, devolvendo ao solo da cidade o seu caráter “líquido”, mutável.

Não se trata de estabelecer linhas, mas faces, oferecendo uma reflexão sobre o instante, sobre o fragmento e tornando a complexa realidade em pausa. Relações não visíveis que descrevem a equação da alma da cidade.

MANUTENÇÃO DO ELEVADO COSTA E SILVA COMO LIGAÇÃO LESTE-OESTE

Sobre o Elevado Costa e Silva circulam diariamente 80.000 veículos das 6:30 h às 21:30 h, de segunda-feira a sábado (aos domingos e feriados ele é fechado). Seu tráfego intenso demonstra sua importância viária como ligação leste-oeste. Desse modo, decidimos mantê-lo com essa função, porém acrescentando novos programas e novo uso para essa estrutura, a fim de valorizar a região onde está situado, dando para a cidade uma nova dinâmica pela criação deste surpreendente espaço de convívio e lazer.

INVÓLUCRO DO ELEVADO

O Elevado Costa e Silva passa em vários pontos muito próximo às janelas dos edifícios do seu entorno, gerando um nível de ruído muito alto. Projetamos um invólucro metálico de fechamento, transformando-o em um túnel. Desse modo, além da melhoria das condições ambientais para sua vizinhança, o Minhocão funcionará 24 horas como rota viária, desafogando o trânsito das avenidas São João e General Olímpio da Silveira que já se mostram congestionadas após o horário de seu fechamento.

As vedações laterais terão níveis de opacidade diferentes durante o trajeto (sempre com o cuidado de não ofuscar a visão de quem dirige) para não entediar o motorista e enriquecer visualmente seu desenho na cidade. Utilizaremos painéis de concreto com espessura de 50 mm e dois vidros temperados (transparentes ou foscos) de espessura de 10 mm separados por um colchão de ar de 80 mm. Nas esquinas e cruzamentos não haverá fechamentos, o ar circulará e a estrutura metálica ficará aparente para a cidade.

CRIAÇÃO DE UM PARQUE SUSPENSO

A cidade de São Paulo é de modo geral carente de parques. Na região do Minhocão isso se mostra evidente aos domingos e feriados, quando ele fica fechado para o tráfego de veículos e a população o utiliza para lazer, apesar da completa ausência de infra-estrutura para tal.

Sobre o túnel propomos um Parque público, com o mais variado programa: espaços de contemplação, mesas com jogos, playground, pistas de skate, ciclovias, espaços para apresentações e exposições ao ar livre, bancas de revistas, postos policiais e de informações turísticas, dentre outros. A infra-estrutura de apoio para seu funcionamento se localizará nos Edifícios de Acesso que, além disso, poderão abrigar cinemas, teatros, restaurantes, bibliotecas, escolas, galerias de arte, shoppings, livrarias, além de estacionamentos subterrâneos, incentivando a utilização deste espaço por visitantes de todas as classes sociais.

CRIAÇÃO DE GALERIAIS LATERIAIS

Ao longo dos 2,7 km do Minhocão, situações de abertura visual junto aos largos e praças surgem, constituindo possibilidades de desenho para o novo Elevado. Assim, foram criadas galerias junto ao túnel proposto, ora em um lado só, ora nos dois lados, para usos tanto públicos como privados (sendo o aluguel destas revertido para os cofres da Prefeitura. Além disso, nas galerias privadas, os fechamentos externos de vidro poderão ser alugados para propaganda, transformando-se em mais uma fonte de receita).

Seu conforto térmico será garantido por ventilação natural através dos caixilhos e por seu alto pé-direito, possibilitando a circulação do ar. Entretanto, todas elas possuirão infra-estrutura para serem climatizadas quando receberem exposições e outros eventos especiais.

O Elevado Costa e Silva tem suas faces voltadas para o Norte, Sul, Leste, Oeste, Nordeste e Sudoeste. Assim, quando necessário, algumas galerias terão sistema de brises: horizontais para aquelas voltadas para o N e NE e verticais para aquelas cujas fachadas são voltadas para o SO e W.

OPERAÇÃO URBANA MINHOCÃO

Para a viabilização do empreendimento e desenvolvimento da região propomos a Operação Urbana Minhocão nos lotes lindeiros ao longo do Elevado, nos mesmos moldes da Operação Urbana Centro, destacando-se: coeficiente de aproveitamento máximo 6 para uso residencial e misto-residencial e não computação, para efeito de cálculo, de coeficiente de aproveitamento para salões de festas, cinemas, teatros e anfiteatros, auditórios, museus, creches, educação/ cultural geral e garagens.

ACESSOS

O acesso às galerias e ao Parque será realizado através de edifícios situados em pontos estratégicos, próximos aos metrôs e vias importantes, em terrenos atualmente sub-utilizados ou pouco construídos.

Os Edifícios de Acesso, além de elevadores e escadas, contarão com toda a infra-estrutura necessária para o funcionamento do Parque, tais como sanitários públicos, telefones públicos, administração e controle, cantinas, bares, restaurantes, cinemas, teatros etc. Está previsto estacionamento com quatro subsolos em cada Edifício de Acesso, totalizando a criação de 2.505 novas vagas. Acima do nível do Parque esses edifícios poderão abrigar os mais diversos programas, desde o uso residencial até o uso comercial.

Além destes edifícios propostos, as galerias também possuem ligação direta com o Parque através de escadas e rampas com acessibilidade universal situados em suas extremidades.

ACESSIBILIDADE UNIVERSAL

O acesso ao Elevado respeitará as necessidades de todos os visitantes independentemente da idade, condição física ou qualquer outro fator, de acordo com a NBR 9050.

SEGURANÇA

A princípio o Parque funcionará 12 horas por dia das 7:00 h às 19:00 h. Eventualmente, caso haja alguma atividade especial, o horário de funcionamento se estenderá ou caso a população queira o prolongamento do funcionamento ele poderá ficar aberto 24 horas. Independentemente disso, foram propostos postos policiais e de informações turísticas ao longo do Parque, além dos Edifícios de Acesso funcionarem também como postos de vigilância. Todos os usuários do novo Elevado devem sentir-se protegidos e seguros, antes, durante e depois de suas visitas.

ESTRUTURA

A arquitetura proposta prevê a execução de novo piso sobre a via elevada existente, além de galerias laterais separadas das vias de circulação por paredes isolantes.

O novo piso tem como estruturação básica a execução de 3 (três) treliças longitudinais apoiadas nas travessas principais do elevado. Estas treliças são responsáveis pela transmissão dos esforços gravitacionais e laterais para estes apoios através de pórticos a cada 40 metros formados pelos montantes de extremidade das treliças e pelas vigas metálicas de piso. O sistema secundário de vigas tem modulação de 10 metros e altura de 1,20 metros e coincide com os montantes das treliças que também servem de engaste das vigas das galerias laterais. O apoio das lajes pré-fabricadas (que podem ser substituídas por “steel deck”) se dá no sistema longitudinal terciário com espaçamento de 2,17 metros entre vigas e que vencem 10 metros de vão.

No sistema proposto os novos carregamentos são dirigidos diretamente para as linhas de apoio dos pilares do Elevado (a cada 40 metros) sem solicitação do vigamento longitudinal existente. A maior solicitação se dá na treliça central, apoiada diretamente sobre a linha de pilares centrais.

Em atendimento a IT-08 os perfis serão protegidos por pintura intumescente.

Logicamente, antes da execução deste projeto deverão ser revistas as estruturas existentes e suas fundações para os novos carregamentos propostos e avaliados os reforços eventualmente necessários.

DESEMPENHO ACÚSTICO

O fato de criar um invólucro no Elevado já diminuirá consideravelmente o nível de ruído sonoro na vizinhança. Fecharemos as suas laterais ora com painéis de concreto de 50mm de espessura, ora com painéis de vidro temperado duplo, espaçados um do outro por um colchão de ar de 80mm. Dentro do túnel será aplicado um forro acústico nas faces inferiores das vigas metálicas de cobertura, composto por lã mineral (espessura de 50 mm) revestida por chapa metálica perfurada. O nível sonoro devido ao transito dos veículos apresentou uma variação de 79dB(A) (sem tratamento) para 68dB(A) (com o tratamento), indicando que a melhora será de 11dB(A).

Na faixa contínua de entrada de ar serão aplicados atenuadores de ruído, constituídos por lâminas dispostas transversalmente à abertura, a cada 25 cm, compostas por lã mineral (espessura de 150 mm), revestidas de chapa metálica perfurada. A mesma solução será aplicada nas faces inferiores das vigas metálicas do piso das galerias (nos casos onde elas acontecem). Com esse tratamento, será ainda atenuada a transmissão de som para o exterior. Considerando que no conjunto a construção proposta atenue 20dB(A), o ruído resultante emitido será da ordem de 48dB(A).

Sob o Minhocão um novo forro percorrerá toda sua extensão, com finalidade de absorção acústica. Na face inferior das suas vigas longitudinais será aplicada lã mineral (espessura de 50 mm) protegida por chapa metálica perfurada. Como esse espaço permanecerá aberto, a redução do ruído propagado será menor, mas ainda assim apresentará uma redução da ordem de 15dB(A) para as regiões vizinhas.

DESEMPENHO TÉRMICO

A aplicação de lã mineral proposta para produzir uma redução do ruído interno do túnel, acarretará em uma queda no valor da condutância térmica global da cobertura para 0,5 (Watt/m²?C). Com isso, os ganhos de calor devidos à insolação ficarão reduzidos a valores inferiores a 20 (watt/m²).

EXAUSTÃO DO TÚNEL

A exaustão será totalmente natural. Nas esquinas e cruzamentos não haverá fechamentos o que possibilitará a ventilação através destas amplas aberturas. Além disso, uma faixa contínua de 45 cm de altura situada nas laterais, em sua parte inferior, promoverá a entrada de ar fresco. A saída de ar se dará nas laterais, na parte superior, em aberturas localizadas no piso do Parque e com área equivalente à de entrada de ar.

ILUMINAÇÃO

ILUMINAÇÃO SOB O MINHOCÃO

Serão instalados projetores embutidos no forro acústico, dotados de lâmpadas de multi-vapores metálicos que produzirão uma luz branca e que apresentam excelência em termos de reprodução de cor, mais adequada para acolher os pedestres e o trânsito local. Estas luminárias estarão dispostas em quatro linhas justapostas duas a duas situadas nos eixos das vias reservadas para os ônibus e terão fachos assimétricos, um voltado para o passeio e outro para a calçada central, evitando desperdício e a poluição visual do forro. Cada módulo entre pilares terá oito pares de luminárias de cada lado, um a cada cinco metros.

ILUMINAÇÃO DO TÚNEL

Na projeção das passarelas laterais instalaremos duas linhas contínuas de lâmpadas fluorescentes, também com refletores assimétricos que banharão de luz os painéis laterais e o interior das pistas, racionalizando a demanda de potência necessária e possibilitando um tráfego em condições agradáveis e satisfatórias. As lâmpadas serão de elevado rendimento luminoso, do tipo T-5 de 80 watts, com vida útil de dezesseis mil horas e que apresentam um baixo consumo em função do fluxo luminoso que oferecem, evitando ao máximo a manutenção. Este aparato de iluminação terá grau de proteção IP-67, possibilitando a sua lavagem e terá difusores de vidro temperado.

ILUMINAÇÃO DAS GALERIAS

Serão utilizadas lâmpadas fluorescentes do tipo T-5 assentadas sobre perfil U metálico de 2 x 4 polegadas, pendurado na laje inclinada, na direção do eixo central da galeria, fornecendo luz indireta e possibilitando às pessoas tanto no seu interior como na rua, não verem pontos de luz isolados no teto, gerando uma iluminação uniforme ao longo do seu comprimento. Sob o trilho haverá projetores dispostos de forma direcionada com a luz projetada sobre os painéis de exposição numa distância adequada e com características específicas conforme a situação: uma exposição artística, anúncios de propaganda, projeções de vídeos e multimídia, grafites, workshops etc.

ILUMINAÇÃO DO PARQUE ELEVADO

Adotaremos o sistema de postes públicos com quatro pétalas dotadas de lâmpadas de vapor metálico com refletor estampado de chapa de alumínio. Estes postes serão dispostos a cada vinte metros ao longo de todo o Parque. Todos os aparatos de iluminação neste recinto deverão ser inacessíveis ao público, evitando vandalismo e depredação.

DRENAGEM

A drenagem do Parque será realizada através da captação das águas pluviais pelos canteiros de vegetação situados ao longo de sua borda. Uma calha contínua nos cantos superiores do Túnel levarão as águas para tubos de queda situados junto ao sistema de apoio do Elevado, que por sua vez caminharão sob o Minhocão entre o forro acústico e suas vigas longitudinais, até finalmente descerem para o canteiro central, junto aos seus pilares, despejando as águas nas caixas de captação que lá já estão. Quanto à drenagem das pistas, utilizaremos o sistema de captação existente, realizando os reparos e acréscimos necessários, com as tubulações atuais reconectadas ao novo sistema de drenagem proposto.

PAISAGISMO

O jardim se apresentará como uma linha que permeia o Parque em toda a sua extensão, ora de um lado, ora no meio, ora dos dois lados. Esta linha verde se mostra muito densa reforçando o contraponto que o parque representa à cidade. Para definir o partido do jardim, escolhemos a união entre a rusticidade e o vigor da flora do semi-árido, com a diversidade e resistência da vegetação do cerrado brasileiro. Agaves, mandacarus e suculentas da caatinga, junto com Velozias, Palmeiras e Bromélias do Cerrado, serão a base florística do jardim do Parque.

A rusticidade das plantas escolhidas confere ao jardim grande resistência à desidratação e baixa manutenção ao longo do ano, características que são muito desejadas para um jardim sobre laje, embasado em apenas meio metro de terra e elevado sobre uma via de tráfego intenso, no centro da cidade de São Paulo.

Ficha técnica
Arquitetura: José Alves + Juliana Corradini
Orçamento: Mauro Zaidan (Nova Engenharia)
Estrutura: Jorge Zaven (Kurkdjian & Fruchtengarten)
Conforto Ambiental : Luiz Carlos Chichierchio (Ambiental)
Climatização: Eizo Kozai (Thermoplan)
Iluminação: Antonio Carlos Mingrone (Mingrone Iluminação)
Paisagismo: Ricardo Vianna (Bonsai)
Maquete Eletrônica: Victor Paixão e Felipe Annunziato













* informações e imagens sobre o projeto 'O Novo Elevado' no site FRENTES Arquitetura