projeto de restauro, castelinho da Rua Apa

R$ 5 milhões. É de quanto precisa o castelinho da Rua Apa
Palco de tragédia familiar em 1937, o imóvel degradado há décadas no centro ganha projeto de restauro. Falta o dinheiro

em O Estado de S.Paulo, por Rodrigo Brancatelli e Vitor Hugo Brandalise, 19/01/2011

Ayrton Vignola/AE
Degradação. Com fama de mal-assombrado,
o castelinho foi tombado pelo Conpresp em 2004
Uma voz fina, um tanto desafinada e um bocado apressada, chamou a atenção do arquiteto Paulo Bastos naquela ligação. "Destino", "ajuda", "projeto", "castelinho", "Apa" era o que dava para entender no meio de tanta afobação da interlocutora. Ontem, tais palavras começaram a ganhar um sentido que pode mudar o destino de um dos endereços mais célebres - e degradados - de São Paulo.

O Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico de São Paulo (Conpresp) decidiu ontem alterar a resolução de tombamento do melancolicamente famoso castelinho da Rua Apa para que o local passe por inédito restauro. É mais um capítulo na conturbada história do edifício de traços ecléticos, na esquina com a Avenida São João, que corre o risco de desabar. O projeto da reforma foi feito por Paulo Bastos, que, depois do telefonema de Maria Eulina Reis Hilsenbeck, presidente da ONG que ocupa o imóvel, decidiu fazer o trabalho gratuitamente.

"Ela ligou falando que só eu tinha atendido o telefone, que era destino, e eu topei fazer", conta. "Ela está fazendo tudo com a cara e a coragem, buscando patrocinadores para restaurar esse lugar tão importante para a cidade."

Para autorizar a obra, conselheiros vão se reunir com representantes da União para liberar a mudança do tombamento, uma vez que o governo federal ainda é dono do terreno. Com a decisão do Conpresp, o castelinho poderá passar por extenso restauro. O trabalho mais difícil, no entanto, começa agora - Maria Eulina já abriu conta para receber doações para bancar o projeto, que deve passar de R$ 5 milhões. "Vai ser um trabalho de formiguinha, mas já tem gente interessada. Com certeza vamos reerguer o prédio", diz Maria Eulina. Ela é presidente da ONG Oficina Profissionalizante das Mães do Brasil, ocupante do imóvel desde 1997. "Será vitrine para artesãos do mundo inteiro, uma espécie de loja colaborativa. Pode demorar, mas vamos fazer."

O imóvel foi tombado pelo Conpresp em dezembro de 2004 - segundo o órgão, trata-se de um "significativo exemplar da arquitetura residencial praticada na capital paulista nas primeiras décadas do século 20 e é remanescente da primeira ocupação urbana da área". Ele é conhecido também por ser motivo de uma das mais famosas disputas judiciais da cidade. Nos anos 1930, era um lugar elegante e admirado, onde moravam os César dos Reis: Maria, a mãe, Álvaro, o filho mais velho, e Armando, o caçula. Em 12 de maio de 1937, o imóvel virou palco de crime famoso: os três membros da família foram mortos a balas de pistola alemã. Segundo autos da polícia, Álvaro matou o irmão, Armando, e a mãe - e se matou em seguida.

A propriedade foi disputada por herdeiros da família até a década de 1980, quando virou propriedade da União. Em 1996, a ONG Mães do Brasil foi autorizada a ocupar um imóvel anexo. O castelinho, porém, continuou abandonado - e até hoje carrega fama de mal-assombrado.

CRONOLOGIA

História de crime e abandono

1912
Pioneira
Construído em 1912 pela família César dos Reis, na Rua Apa, n.º236, o Castelinho é remanescente da primeira ocupação urbana da região.

1937
Crime
Segundo autos policiais, Álvaro Reis matou a mãe, Maria, e o irmão, Armando, no local, em 12 de maio de 1937. As circunstâncias do crime nunca foram esclarecidas.

1987
Litígio
Disputado por herdeiros, vira propriedade da União.

1996
Novo uso
A União autoriza ONG Mães do Brasil a ocupar o local por 50 anos. Entidade, porém, usa imóvel anexo.

2004
Proteção
Castelinho é tombado pelo Conpresp.

2009
Preservação
Justiça decide que a União deve preservar e reformar o imóvel. Governo afirmou esperar aval do Conpresp.

>> link para matéria original sobre o projeto de restauro do castelinho da Rua Apa